Faixa a faixa do EP “Cabresto” – Diego Perin

Por Anderson de Souza
foto: Luana Angreves
Avaliação: 😀 📣 💡

O primeiro EP ‘Cabresto’ de Diego Perin é pop sem parecer óbvio, tem protesto sem ser panfletário e flerta com sonoridades diversas: rock, afrobeat, folk, brega e música latina. Ao ouvir as letras das quatro canções é muito claro o tom do momento em que vivemos no Brasil.

O ex-baixista e backing vocal da Banda Gentileza descreve  – com muita coragem – sua estreia autoral com a seguinte frase: “A arte reflete o que vivemos. É inadmissível ficar alheio a dor dos outros”.   

Segundo Perin, seu extended play é mais pesado e irônico que o da antiga banda. “Acho que os assuntos são mais sérios. Tem uma canção que lembra Doors. Nem era minha intenção, mas quando mostrei pros amigos e amigas, eles apontaram a influência que eu nem sabia que tinha. Uma inspiração proposital foram os uivos do Howling Wolf”, comenta.     

Para entender um pouco do novo trabalho desse paulista – radicado em Curitiba -, ele comentou música por música para o Muito Post.

Leia abaixo sobre ‘Cabresto’ nas palavras do próprio compositor.

01 – Cabresto

“A música surgiu de reflexões sobre a ferramenta mais eficaz, e besta, de manipulação da sociedade. O medo. Depois de assistir ao filme chileno ‘No’, que fala sobre o plebiscito para acabar ou não com o regime ditatorial (militar, olha só!) do Pinochet, esse assunto ficou rondando minha cabeça e volta e meia entrava nas conversas que tinha com a Luana. Uma população com medo procura bodes expiatórios. Através desses inimigos inventados, você promove a união dentro de um pacto nacionalista distorcido. Depois disso é fácil manobrar a galera pra onde se quer. Vale lembrar que o medo é a antecipação sobre algo que ainda não existe e pode nem vir a existir. Poxa, uma campanha baseada em medo foi instaurada pra colocar o cara no poder em 1973. O Trump foi eleito nos Estados Unidos com uma campanha baseada no medo que a população tem em relação ao resto do mundo.

A própria campanha do impeachment da Dilma foi baseada nisso. Pessoas esbravejando em púlpitos sobre como os comunistas (sério galera, em plenos anos 2018) iam invadir o Brasil e você ia ter que dividir sua casa com venezuelanos. Hitler criou isso através da sua máquina de propaganda. É cíclico. Sempre usam e sempre cola. Bizarro. Terrorismo é uma palavra relativamente nova e acredito que poderia ser utilizada pra esses episódios históricos também.

Nessa música eu peguei só uma faceta, que é o papel da mídia tradicional, baseada em interesses econômicos, onde seus veículos são negócios. Negócio que vende discurso. Discurso difere de verdade. Ainda falta falar sobre o papel da tal da rede social, fake news e dos imbecilizadores profissionais. Mas essa ópera rock vai ter que ficar pra depois.”

02 – A dor dos outros

“O refrão veio antes de tudo. Depois que presenciei uma situação que envolvia uma dor de dente e falta de empatia. Não acredito que foi maldade. Acredito que ela nem tenha se tocado da situação. Nisso pensei: “essa pessoa nunca teve uma dor de dente, não é possível!” O riff/tema veio quando estava assistindo ao show do Metá Metá no Teatro do Paiol no mesmo dia. Só veio na minha cabeça. Depois fiz uma relação entre o quanto o cotidiano é avassalador e sobre a máxima do “esse problema não é meu”. Por quem os sinos dos funerais dobram, afinal? Veja o caso brutal da Marielle. Pessoas fazendo piada sobre a execução de alguém. Eles dobram por todos nós, chefia, cada ser humano que sofre e/ou é morto nos diminui enquanto espécie.”

03 – Tapeçaria de asfalto

“Eu e meu pai pensamos de formas bem distintas. Isso não diminui o quanto a gente se gosta, mas é super difícil pra nos comunicarmos. A gente não se entende. Então resolvi liberar isso em forma de canção. Essa música surgiu de uma conversa que tivemos em São Paulo. Tudo o que eu colocava como a minha opinião sobre como as coisas deveriam funcionar, relações humanas, ele descartava como utopia. Po! Utopia é um guia, é o ideal, são através delas que acredito que deveríamos nos pautar. Antes de descartar, deveríamos abraçá-las. Acreditar que as pessoas podem ser melhores umas com as outras é, pra mim, uma fé mais útil que a que se tem em Deus.”

04 – Salto

“Salto é sobre esse EP. Logo após o fim da Banda Gentileza, eu senti um medo repentino e profundo de não conseguir fazer o que eu mais amo: música. Sabe o animal que congela quando vê o farol do carro? Nunca fui um compositor, até então. A partir de Agosto de 2016, tive que me tornar um compositor, apesar do medo e da profunda sensação de nudez (vergonha?) que sinto estando na frente das pessoas cantando minhas ideias. Para mim o que interessa, o que me motiva a fazer uma música, é transmitir uma ideia.

Resolvi fechar o EP com ela, porque Salto é, de certa forma, uma canção que fala sobre enfrentar o medo também. Cabresto é sobre o medo que querem te incutir pra te cegar e nessa falo do medo que nós nos impomos. Outra faceta, mesmo discurso. Tudo bem sentir medo, mas apesar dele, salte! Pelo menos por um breve, breve momento, você flutuará e  será a melhor sensação do mundo. No momento estou em queda livre.”

Download do EP completo em:  www.diegoperin.com.br

Escute o EP ‘Cabresto’ de Diego Perin

Diego Perin

Diego Perin estuda música desde os 15 anos, quando ainda morava em sua cidade natal, Igarapava, São Paulo. Desembarcou em Curitiba para cursar Publicidade e Propaganda na UFPR e na universidade, em 2004, conheceu seus colegas da Banda Gentileza. Em 10 anos de carreira, a banda tocou nos renomados festivais: Psicodália (Rio Negrinho/SC), Path (São Paulo/SP), Calango (Cuiabá/MT) e Contato (São Carlos/SP). A canção “Afinal de Contas” foi tema de personagem da novela da Rede Globo, Malhação de 2013. O músico tocou também na banda Lemoskine e acompanhou o cantor Leo Fressato. Atualmente, além de se dedicar a composição do seu trabalho solo, Diego é baixista da banda que acompanha a dupla Estrela Leminski e Teo Ruiz.

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